quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Nossas Leis: O Kidush da noite de Shabat


Nossas Leis:
O Kidush da noite de Shabat


                                                   

“Aquele que recita o ‘Vayechulu’ (o Kidush) na noite do Shabat é considerado como se ele se tornasse parceiro de D’us na criação do mundo” (Talmud, Tratado Shabat, 119b)



A recitação do Kidush na noite de Shabat, cujo cumprimento cabe igualmente a homens e mulheres, é um dos mandamentos judaicos mais significativos e amplamente observados.

A guarda do Shabat – o único ritual judaico que é um dos Dez Mandamentos – é um dos pilares do judaísmo. É um mandamento tanto positivo quanto negativo. Isso significa que seu cumprimento se baseia em atos de cometimento e omissão. A Torá nos ordena “lembrar” (zachor) e “guardar” (shamor) o Shabat. “Guardamos” o Shabat abstendo-nos de realizar quaisquer dos 39 trabalhos (melachot) e suas derivações (toladot) proscritos nesse dia sagrado, e o “lembramos”  recitando o Kidush nas noites de sexta-feira.

Como o Shabat abrange duas diretrizes Divinas, não se trata de uma mitzvá do tipo “tudo ou nada”. Portanto, mesmo aqueles que não o “guardam”, devem cumprir o mandamento que ordena: “Lembra-te do dia do Shabat para santificá-lo” (Êxodo, 20:8), por meio da recitação do Kidush antes do jantar da noite de sexta-feira.

A recitação dessa bênção serve, portanto, para cumprir o mandamento positivo de “lembrar” do Shabat pelo fato de que o texto do Kidush enfatiza a santidade do dia – a distinção entre os seis dias mundanos da semana e o sétimo, sagrado. Há um princípio geral no judaísmo de que, na medida do possível, um evento espiritual deve ser expresso através de um ato físico. Daí o Kidush ser ligado à ingestão do vinho; não basta apenas recitar palavras sagradas.

De modo geral, ao recitar o Kidush, o fazemos sobre uma taça de vinho necessariamente casher e, de preferência, tinto. No entanto, se entre os participantes alguém não pode ingerir bebida alcoólica, esta pessoa deverá tomar suco de uva casher. A bênção é idêntica à do vinho. No caso de não haver vinho ou suco de uva casher, pode-se fazer o Kidush sobre o pão e, em vez de recitar a bênção Bore Peri HaGuefen, “que cria o fruto da videira”, diz-se, Hamotzi Lechem min Ha’aretz, “que tira o pão da terra”. Quando se usa pão em lugar de vinho, é preciso fazer a lavagem ritual das mãos (Netilat Yadaim) antes de fazer o Kidush, para que se possa comer o pão imediatamente após o término de sua recitação.

O Shabat é consagrado por meio de um ato físico porque o propósito dos mandamentos da Torá é santificar o mundo, infundindo o material no espiritual. Isso explica por que se usa vinho, em particular, no Kidush: por um lado, serve como um componente do prazer humano; por outro, por ter sido a única bebida, à exceção de água (em Sucot), que serviu de libação no altar do sacrifício no Tabernáculo e no Templo Sagrado de Jerusalém. O vinho, portanto, serve tanto como propósito físico quanto espiritual. Como o Talmud diz: “O vinho alegra D’us e o homem”.

Mas como o vinho, especialmente o tinto, é um símbolo de severidade e julgamento (a cor vermelha remete ao sangue) – a Cabalá nos recomenda adicionar ao vinho do Kidush uma pequena quantidade de água, que simboliza amor e graça. Primeiro o vinho é colocado quase que até a borda do copo 
de Kidush; a seguir, acrescenta-se um pouquinho de água. Esta cria uma “mistura” adequada de harmonia entre a benevolência e a severidade – ou seja, as duas primeiras Sefirot emocionais: Chessed e Guevurá.

Durante a recitação do Kidush da noite de sexta-feira, todos os presentes ficam de pé, porque o desempenho de tal mandamento Divino equivale a prestar testemunho de que D’us criou o mundo e, segundo a Lei Judaica, as testemunhas precisam ficar de pé ao depor. Ao dizer o Kidush, a pessoa atesta que D’us criou os Céus e a Terra. Essa é a base e o fundamento para a santificação do Shabat e para a sua observância. Diz a Torá: “(O Shabat) é um sinal entre Mim e os Filhos de Israel para sempre, que em seis dias o Eterno fez os céus e a terra, e no sétimo dia Ele cessou e descansou” (Êxodo, 31:17).

Enquanto recita o Kidush, a pessoa deve ter em mente que está cumprindo esse mandamento Divino tanto para ele como para todos os presentes. Já os ouvintes, estes devem ter em mente que o fato de ouvir o Kidush equivale a se eles próprios o estivessem recitando. Portanto, devem ficar em silêncio, e responder “Amén”. Quem interromper o Kidush por qualquer motivo, por exemplo, até mesmo para dizer “Baruch Hu U’Baruch Shemó” (Abençoado é Ele e abençoado é Seu Nome) invalida o cumprimento desse mandamento Divino para si próprio.

Uma vez recitado o Kidush, aquele que fez essa bênção bebe uma quantidade significativa do vinho, participando assim da comunhão do físico com o espiritual, que é a essência dos rituais judaicos. É costume que todos os presentes provem do vinho do Kidush. Contudo, quem participa da cerimônia e ouve a bênção sem interrompê-la, cumpriu com a obrigação mesmo sem ter bebido do vinho.

O texto do Kidush

No texto do Kidush, há duas partes distintas, separadas uma da outra pela bênção do vinho. Em algumas versões do Kidush, há exatamente 35 palavras em cada uma das partes, perfazendo um total de 70, que é o número místico da noite de Shabat. Esse número também representa um múltiplo de dois números significativos: sete, o numeral do sétimo dia, e dez, que alude às Dez Sefirot – três intelectuais e sete emocionais.

A primeira parte do Kidush, que é retirada da Torá, sendo, portanto, de autoria Divina, fala do Shabat do ponto de vista transcendental do Criador, como sendo o objetivo e conclusão perfeita da Criação. 

A segunda parte foi cunhada pelos Sábios. A primeira parte descreve o aspecto Divino do dia sagrado, ao passo que a segunda expressa sua santidade sob a óptica do Povo Judeu, expressando todos os elementos que constituem a natureza do Shabat e o relacionamento especial entre esse dia e o Povo de Israel.

A segunda parte do Kidush se inicia com a abertura para as bênçãos sobre qualquer mandamento Divino: “Bendito és Tu, Eterno, nosso D’us, Rei do Universo, que nos santificaste com Teus mandamentos”. Tais palavras expressam que os mandamentos Divinos são uma forma de adquirir santidade e, ainda mais, que os próprios mandamentos são um ato de santidade. Por meio dos mesmos, somos santificados perante o Eterno, pois enquanto estamos engajados em um Mandamento Divino, estamos unidos a D’us. Enquanto estamos cumprindo Sua Vontade, nós seres humanos finitos, unimo-nos com o Ser Infinito.

O Êxodo do Egito é também mencionado na segunda parte do Kidush, porque o Shabat – dia de descanso da labuta – é associado com a libertação de nosso povo da escravidão no Egito. Israel, povo de escravos, adquiriu a redenção e a liberdade, tornando-se uma nação de homens livres, capaz de cessar o trabalho e descansar em determinados períodos. Em sentido mais profundo, o Êxodo do Egito simboliza a libertação de certas experiências e atribulações e prisões terrenas, e a ascensão ao serviço Divino. A libertação do Egito foi uma metamorfose para o Povo Judeu: passamos de escravos de um rei perverso a servos de um Ser Infinitamente benevolente. Todas essas idéias estão incorporadas no Shabat, quando descansamos de todos os labores do mundo físico e transcendemos o mundano, adentrando um período de tempo sagrado e santificado por D’us.

Assim sendo, para podermos melhor apreciar o significado do Kidush, preparamos, com base nos ensinamentos de nossos Sábios, uma breve transliteração, tradução e comentários, frase por frase, explicando o texto do Kidush, a partir do Sidur do rito sefaradita.



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