terça-feira, 8 de março de 2011

MARRANOS RESURGINDO DAS "CINZAS"

MARRANOS - RESURGINDO DAS "CINZAS"

Autor: Marlon Jorge Albuquerque

Uma saga, uma história, gerações perdidas, despatriadas, intolerância religiosa, verdades escondidas, perda do credo, perda dos filhos, desapropriações, tratamentos desumanos, perda do próprio nome, suplícios, cremações em praça pública, dor, ódio, desespero e morte.

Esse contexto se relaciona aos judeus que viveram momentos da história de horror, pelo fato de terem nascidos num lar judeu, sofreram e morreram. Como podemos explicar este trecho da história humana? O que foi tão valoroso para que tudo isso ocorresse? Com certeza houve um valor seja ele qual for. Somente o ódio não seria capaz por si só, nem o mais profundo ódio seria capaz de trazer tanta maldade sem estar acompanhada de uma lógica.

Estamos falando da história dos Marranos, os judeus forçados ou crípto-judeus, que foram perseguidos pela Igreja Católica e pelos Protestantes entre os séculos XVI e XIX. A Igreja Católica iniciou essa perseguição a partir do Século I, quando a personalidade "jurídica" da Igreja Católica era apenas o Estado, o Governo, o Império Romano, que nas mãos do Imperador Vespasiano e seu querido filho Tito o General das legiões, do exército romano, chegou a Jerusalém e dizimou todos que ali se encontravam, levando consigo o espólio da guerra, da vitória triunfal para sua pátria amada, Roma. Os judeus que não morreram, escaparam para o Galut. O exílio inicia-se mais uma vez, desta vez para a Península Ibérica, Marrocos, Turquia e outros países vizinhos.

Devido os tratados políticos a partir do século XIV, a maior parte da Europa aderiu aos éditos e concílios da Igreja Católica que buscou historicamente o domínio religioso e filosófico que a partir de então todos que fossem pego com práticas hereges (judaizantes) deveriam ser supliciados até que chegasse perto da morte e por ultimo ser executado, queimado em praça pública, isso era um ato de purificação para a Igreja o que veio fazer com que todos os judeus que se encontravam debaixo da autoridade do Estado religioso fugissem.

Em Portugal o rei D. Manuel I conhecido também por D. Manuel de Bérrio, no início do século XVI inicia um processo de expulsão dos judeus do Estado portugues, nesse sentido os judeus já não mais tinham saída, voltar para Espanha ou Israel não dava mais, os judeus estavam na ponta da Península Ibérica para serem jogados no oceando Atlântico, sem saída ou Deus faria mais um milagre ou seria o fim destes opóbrios judeus. Mas o Deus de Israel não exitou em abrir o mar vermelho novamente, só que desta véz foi o Oceano Atlântico, indo todos para as Américas.

Antes que todos saíssem tiveram que pagar por suas liberdades, como se fosse um tipo de fiança para Portugal, só sendo liberados ainda após todos terem sidos batizados com nomes de famílias portuguesas, assim, ou aceitavam esse tratado ou seria o fim. Assim o Brasil foi habitado por "bandidos", esse foi o nome que os condenados da Inquisição dos quais seus nomes se encontram registrados na Torre do Tombo em Portugal até os dias de hoje levaram, bandidos por não terem aderidos e/ou terem resistidos as imposições das Igrejas cristãs.

A perseguição parecia ter tido fim, mas isso não foi verdade, os braços do "Santo Ofício" chegou até o Brasil, isso veio a colaborar também para que o Brasil fosse desbravado, fazendo com que os judeus saissem do litoral e se embreassem no interior brasileiro. Ao chegarem no Brasil, atracaram no Estado da Bahia e sairam para Perambuco, subiram para o nordeste, posteriormente, desceram para Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso com a busca do ouro numa forma de se verem livres dos olhos da Igreja para continuarem as suas tradições, o medo de serem pegos em práticas judaicas, mudavam suas práticas como forma de manterem aceso o pavil da esperança para posteridade, como? Através de casamentos entre parentes, como uma forma de preservação da etnia, rituais familiares, rituais fúnebres e costumes.

A história de Antônio José da Silva – o Judeu, preso pela Inquisição em 5 de Outubro de 1737, (isso a menos de 300 anos) acusado de praticar o judaísmo, foi executado na fogueira em Lisboa em 18 Outubro de 1739, aos 34 anos, na frente de seus familiares, num "auto-de-fé" presidido pelo rei D. João V, "O Magnânimo". No mesmo dia foram queimados mais dez "judaizantes". Esse fato foi um marco para a história dos judeus no Brasil.

O Brasil enquadra-se desde o advento da República, com a edição do Decreto119-A, de 17 de janeiro de 1890, que instaurou a separação entre a Igreja e o Estado, como um Estado laico. A história das Constituições brasileiras foi influenciada diretamente pela Igreja, que preferiu deixar de ser repressora passando para a defesa, uma questão de evolução politizada.

Os costumes marranos no Brasil quase tiveram fim, não fossem os dados históricos e as tradições familiares, bem como, o êxodo do povo no território brasileiro e os nomes de batismos. Todos esses dados são um conjunto de fatos que levam a um cidadão brasileiro ter a possibilidade de ser parte dessa saga. Hoje a ciência com seus avanços consegue aproximar mais ainda essa possibilidade em até 99% de alguém ser um descendente de judeu perseguido pela Inquisição, de ser revelado seu passado e sua história familiar, através do DNA e da pesquisa genética.

O processo de retorno dos marranos ao Estado de Israel está iniciando após 500 anos, por questões de conscientização do indivíduo de sua história, envolvendo cada ancestralidade, mas não basta ser apenas descendente, para ser um judeu original ele deve voltar-se aos princípios da Torah, do Pentateuco, dos costumes e filosofias de vida da Bíblia Hebraica, do Único Deus, do monoteísmo, como forma de resgatar totalmente sua origem, devendo se desconverter totalmente ao cristianismo e de seus princípios fundamentais como por exemplo a fé em Jesus Cristo, o que torna difícil para muitos dos que reconhecem sua descendência judaica, pois já assumiu essa postura como princípio fundamental de sua vida. Isso é normal, pois temos que entender que o fundamento religioso é individual e pessoal e não por força. Em qualquer história sempre haverá um remanescente.

No dia 22 de julho de 2010, o Sindicato Israelita das Comunidades Anoussita(SICA) sediada em Israel, por seu presidente Dr. Asher ben-Slomo, fez um simpósio sobre a questão marrana no Knesset (Congresso de Israel) buscando o entendimento e o apoio do parlamento israelense na causa dos marranos, qual teve sucesso com apoio dos deputados daquela casa legislativa, como é o caso do Deputado e Rabino Haim Amsalem que considera os marranos "semente de Israel", o Deputado Yaackov (Katza Le) Katz, Chefe da Coligação Ichud Leumi (União Nacional) e o Deputado e Professor de Medicina Arieh Eldad.

No dia 26 de outubro do corrente ano, estive como Porta-Voz do SICA com uma comitiva representativa do grupo com um público de 40 pessoas frente à Embaixada de Israel em Brasília. No ato denominado como Manifesto o Dr. Guiora Backer, Exmº Embaixador de Israel no Brasil, nos recebeu em seu gabinete e recebeu de nossas mãos o Manifesto que solicita do governo de Israel providências no sentido de enviar ao Knesset projeto de lei que possibilite o retorno do grupo como reconhecidamente descendentes de judeus. O próprio Embaixador disse que "reconhece os marranos como parte do povo judeu exilado".

A Igreja Católica através do Papa João Paulo II reconheceu seus atos de horror e os erros do passado, isso não reparou as conseqüências causadas por ela e nada poderá reparar tamanho dano causado, tudo bem, isso foi um processo histórico e parte da história humana. Agora temos que reconstruir essa história.

Muitos me perguntam por que só agora vocês estão querendo retornar ao seio do povo de Israel? O problema é que sempre houve essa vontade de retornar, mas as adversidades, influências e ingerências, impediram que ocorresse o início do processo, sem falar que nossa história é um problema que afetava a Igreja e os princípios judaicos pelos níveis de alienação causados pelo processo histórico, sem falar do medo até hoje de represálias. O Brasil é um país cristão, a abertura da filosofia religiosa está sendo sedimentada a partir da Constituição brasileira de 1988, a liberdade religiosa está socializando-se, onde as convicções fazem parte de um trabalho político de convencimento, filosófico e histórico que estão fundamentados nos princípios dos direitos do homem.




- Ângelo Adriano Faria de Assis Macabeas da Colônia: criptojudaismo feminino na Bahia- séc.XVI-XVII. Niterói, UFF, Doutoramento, 2004, mimeo.

- Anita Novinsky Inquisição - Prisioneiros do Brasil, séculos XVI- XVIII. Rio de Janeiro, Expressão e Cultura, 2002 e Lina Gorenstein "O Brasil marrano - as pesquisas recentes" - comunicação apresentada no Seminário Interno do Laboratório de Estudos sobre a Intolerância, 2005 e publicada no site http://www.rumoatolerancia.fflch.usp.br

- Anita Novinsky Cristãos-novos na Bahia São Paulo, Perspectiva, 1972, cap. "O Homem dividido" e Lina Gorenstein A inquisição contra as mulheres, op.cit.,p.387 e seg.

- Anita Novinsky "Ser marrano em Minas Colonial" in Revista Brasileira de História. São Paulo, ANPUH/Humanitas, n.40, julho de 2001, pp.161-176.

- Lina Gorenstein A Inquisição contra as mulheres. São Paulo, Humanitas, 2005, p.319 e seg.

- Lina Gorenstein Ferreira da Silva Heréticos e Impuros - Inquisição e cristãos-novos no Rio de Janeiro, século XVIII. Rio de Janeiro, Séc. Municipal de Cultura, Depto de Informação e Editoração, 1995, cap. 5 "A Igreja contra o Judaismo", p.101-113

- Primeira Visitação do Santo Oficio às Partes do Brasil - Denunciações e confissões e Pernambuco (1593-1595). Recife, Fundarpe, 1984 (introdução José Antonio Gonsalves de Mello), p.30 e seg.

http://www.artigonal.com/educacao-online-artigos/marranos-resurgindo-das-cinzas-3589394.html

Perfil do Autor

MARLON JORGE ALBUQUERQUE

Judeu, 39 anos, casado, pai de dois filhos, 1º Sargento da PMGO, Formado em Direito pela Universo e pós-graduado em Direito Constitucional e Administrativo pela PUC-GO. e-mai: sgt-albuquerque@hotmail.com

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